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Rua Voluntários da Pátria, 959 - Centro Histórico, Porto Alegre - RS.

Projeto de Restauração

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A edificação localizada na Rua Voluntários da Pátria, nº 959, apresenta arquitetura eclética com predominância do neoclássico, marcada pela uniformidade e alinhamento direto com a calçada, com paredes externas encostadas nas divisas do lote. Esse projeto reforça o limite entre espaço público e privado, evidenciado pelas portas e janelas que se conectam diretamente à rua.
Construído entre 1893 e 1919, o imóvel abrigou, em 1919, o armarinho “Casa Branca” de João Baptista Galleano. Originalmente registrado como nº 311, foi renumerado como nº 959 na década de 1930, abrangendo outros imóveis na Rua Garibaldi. Alterações posteriores levaram à demolição parcial em 1956, preservando o núcleo principal.
A fachada exibe elementos característicos do estilo eclético, como adornos modelados, sobreportas, cartelas e coroamentos com balaústres. As janelas, de diferentes tipologias com arcos ornamentados, apresentam molduras decoradas com grinaldas e florais, criando uma composição visual simétrica e harmoniosa que valoriza a grandiosidade da construção.
O contraste funcional entre o térreo, voltado para o comércio, e o pavimento superior, destinado à residência, é sutilmente demarcado pelo projeto arquitetônico. Essa integração de funções, comum nos sobrados da época, é evidenciada na circulação longitudinal que conduz à escada central, conectando os dois pavimentos. Segundo Mattar, esse partido arquitetônico era recorrente na Rua Voluntários da Pátria, onde moradia e trabalho coexistiam na mesma edificação.
As áreas sociais do sobrado ficavam na frente, voltadas para a rua, enquanto os serviços ocupavam os fundos, com iluminação natural. Entre ambos, localizavam-se as alcovas, pouco iluminadas. As paredes externas eram de alvenaria de tijolos e as internas, de ripas rebocadas. O telhado, frequentemente de telhas Marselha, e os pés-direitos de 4 a 5 metros refletiam a robustez da construção.
Em 29 de novembro de 2018, um incêndio destruiu a parte superior da edificação, que funcionava como pensão. Quatro pessoas faleceram no incidente, e a falta de um Plano Simplificado de Prevenção Contra Incêndio resultou na interdição do prédio. Em 27 de novembro de 2019, o imóvel foi vendido à Igreja Pentecostal Assembleia de Deus.
Projeto de restauração:
Ao realizarmos um restauro, mergulhamos na história das casas e das famílias, pois ela nos guia e enriquece nosso trabalho. E, por vezes, nos deparamos com coincidências surpreendentes.
A Casa Frasca, datada de 1911, e a Casa Rosa (Casa Faillace), de 1910 — ambas projetos de restauro do Studio 1 — foram projetadas pelo mesmo arquiteto, Germano Pedro Plentz. Ele teve uma curta, porém intensa, carreira entre 1906 e 1910, período em que foi responsável por 22 construções, incluindo palacetes localizados nas ruas André Puente, Cristóvão Colombo e na Avenida Independência, áreas de grande prestígio à época.
Além disso, as histórias das famílias Frasca e Faillace revelam um vínculo ainda mais profundo: ambas são de origem moranesa (Morano Calabro, Itália) e se estabeleceram em Porto Alegre para abrir comércios de tecidos. Essas trajetórias ilustram a força da migração moranesa na cidade.
Os moraneses trouxeram consigo uma experiência comercial sólida adquirida em sua terra natal, adaptando-se rapidamente ao contexto urbano de Porto Alegre. O primeiro livro de registros comerciais da cidade, iniciado em 1891 e encerrado em dezembro de 1913, aponta que 34 empresas registradas nesse período pertenciam a imigrantes moraneses, totalizando 32 estabelecimentos comerciais.
Desses, sete estavam localizados na Rua dos Andradas, a principal via comercial da época, sendo dois classificados como atacadistas de grande porte. Outros 13 estabelecimentos concentravam-se na Cidade Baixa, um conhecido reduto de imigrantes do sul da Itália. A maioria atuava na revenda de tecidos e calçados, enquanto apenas duas firmas se dedicavam à produção de mercadorias.
Essa dinâmica destaca uma diferença marcante entre os imigrantes italianos que chegaram a Porto Alegre no final do século XIX e os que, desde 1875, se dirigiram para a serra gaúcha. Enquanto os primeiros se inseriram no meio urbano e no comércio, os últimos vieram com o objetivo de colonizar terras e se dedicaram principalmente à agricultura. Porto Alegre, assim, tornou-se um verdadeiro gueto italiano urbano, refletindo a riqueza cultural e econômica trazida por esses imigrantes.
No processo de restauração, como o que estamos desenvolvendo para a Casa Rosa, realizamos muita pesquisa e análise de documentos, registros e fotos, além de criar ferramentas essenciais como o mapa de danos (representação gráfica que identifica, registra e analisa os problemas de uma edificação, como trincas, infiltrações, corrosão e descolamento de revestimentos).
Para edificações históricas, o mapa é indispensável para proteger o patrimônio cultural. Já em prédios modernos, ele contribui para a segurança estrutural e previne problemas futuros.
Essa ferramenta é crucial para nortear o trabalho, garantindo eficiência e precisão no planejamento e no orçamento. Um passo essencial para preservar histórias e espaços!
Os trabalhos de restauro têm como diretrizes a recuperação das lesões e a conservação da tipologia arquitetônica original da edificação, preservando sua autenticidade sempre que possível. As intervenções estão divididas em três etapas principais:
I - Intervenção no telhado e no interior da edificação:
Será realizada a remoção completa da estrutura de madeira remanescente do telhado, danificada pelo incêndio. A estrutura do entrepiso será revista integralmente, assim como o reboco interno comprometido pelas intempéries e pelo fogo, que será removido.
II - Reforço estrutural e intervenção nas fachadas:
Após a etapa inicial, será executada a limpeza das fachadas com jato de água de baixa pressão e escovação com cerdas plásticas, além do uso de ar comprimido para ornatos frágeis. Revestimentos degradados serão removidos, e novas aplicações seguirão a composição original identificada em análise laboratorial. Rebocos com integridade estrutural serão preservados, e lacunas serão preenchidas com reboco compatível. A camada pictórica existente será lixada, e novas tintas à base de silicato, em cores indicadas no projeto, serão aplicadas após a cura do reboco.
Esquadrias faltantes serão recriadas conforme o modelo original, enquanto as existentes serão restauradas, com remoção cuidadosa da camada pictórica e tratamento adequado antes de nova pintura.
III - Acessibilidade e Retrofit:
Elementos modernos serão introduzidos, como uma circulação vertical (elevador ou plataforma elevatória) e adequações horizontais em estrutura metálica reversível. Escadas serão ajustadas à NBR 9050, e sanitários unissex PNE serão instalados.
Novas intervenções:
- Cobertura em vidro com estrutura metálica;
- Pórtico de acesso em aço corten;
- Instalação de esquadrias novas e sanitários adicionais.
Essas ações visam integrar preservação e funcionalidade, alinhando o edifício às normas contemporâneas sem comprometer sua identidade histórica.
Casa Rosa